quinta-feira, 10 de novembro de 2011

CNN: Irão proíbe universidade informal, considerando-a "culto extremista"

Hoje, Keivan Mohammad Hassan vive uma vida tranquila com a sua família, como engenheiro civil em Sacramento, na Califórnia. Mas as coisas poderiam facilmente ser muito diferentes.

Hassan acredita que se ele não tivesse abandonado a sua terra natal como refugiado, ele provavelmente estaria entre o número de Bahá’ís iranianos que enfrentam anos atrás das grades simplesmente por trabalhar para proporcionar um ensino superior aos membros mais jovens da sua comunidade.

"Se eu e minha esposa estivéssemos lá, seríamos presos", afirma.

Keivan Mohammad Hassan, ex-aluno e professor no BIHE
Hassan, com 31 anos, é membro da Fé Bahá'í, a maior minoria religiosa do Irão, que se estima ter 300.000 membros. Considerados pelo clero dirigente como apóstatas, os Bahá’ís têm sido perseguidos no Irão desde que a sua fé ali apareceu em meados do século XIX.

Aos seus membros, na República Islâmica de hoje, é sistematicamente negado o acesso ao ensino superior, afirma a Amnistia Internacional.

"As pessoas candidatam-se à universidade e suas candidaturas são recusadas, apesar de terem bons resultados na escola secundária", declarou Elise Auerbach, a especialista da Amnistia Internacional (EUA) para o Irão.

"Eles não conseguem obter certificados, e por isso eles são impedidos de exercer todos os tipos de profissões. Eles não podem ser médicos, advogados, professores universitários ou cientistas."

Em resposta, os Bahá’ís improvisaram uma faculdade descentralizada, semi-oculta conhecida como Bahá’í Instute for Higer Education (BIHE).

Desde 1987, o BIHE organizava aulas em salas de estar e cozinhas de lares Bahá’ís, recorrendo ao esforço de professores Baha’is voluntários, muitos dos quais perderam os seus empregos em universidades iranianas devido às suas crenças religiosas.

De acordo com David Hoffman, fundador de uma campanha de apoio aos bahá'ís do Irão na sua busca pelo ensino superior, a faculdade já tem cerca de 2.000 licenciados; um em cada dez acedeu a pós-graduação nas 60 universidades fora do Irão que reconhecem os cursos do BIHE.

"É uma solução criativa para um dilema real", disse Hoffman. "Estas pessoas são muito resistentes."

Em Maio, mais de 30 casas de Bahá’ís no Irão foram invadidas como parte de uma ofensiva contra o BIHE. Posteriormente, a instituição foi declarada ilegal de acordo com grupos de direitos humanos, e sete professores e administradores foram condenados no mês passado a quatro e cinco anos cada, por estarem envolvidos num grupo ilegal com o objectivo de cometer crimes contra a segurança nacional.

Entre eles estava o orientador académico de Hassan durante os cinco anos no BIHES, Mahmoud Badavam.

"É inacreditável", disse Hassan. "Estas são pessoas normais, eles não são anti-governo. Quando o governo bloqueou a sua educação, eles apenas procuraram outro caminho. Agora estão prendê-los porque eles encontraram alternativas para os direitos que lhe foram negados."

A campanha global contra a perseguição à educação dos Bahá’ís do Irão está a ganhar impulso, com a exibição em várias universidades americanos do Education Under Fire, um documentário sobre o assunto.

Os Prémio Nobel da Paz, Arcebispo Desmond Tutu e José Ramos-Horta, assinaram uma carta aberta apelando o Irão para que retire incondicionalmente as acusações contra os educadores Bahá’ís.

"É particularmente chocante quando déspotas e ditadores no século 21, para subjugar as suas próprias populações, tentam negar-lhes a educação", lê-se.

A carta também apela aos académicos em todo o mundo para registar a sua desaprovação junto dos seus pares iranianos, e a considerar o reconhecimento dos cursos do BIHE ou oferecer bolsas de estudo.

A perseguição aos Bahá’ís do Irão não se limita ao sector educacional, de acordo com grupos de direitos humanos. Sete dirigentes religiosos Bahá’ís estão actualmente presos por crimes que incluem "espionagem para Israel", "insulto a santidades religiosas" e "propaganda contra o sistema", segundo a Amnistia Internacional.

A organização considera os dirigentes Bahá’ís como prisioneiros de consciência, e diz que as suas condenações tiveram motivações políticas. Acrescenta que aos Bahá’ís não são permitidas reuniões, realizar cerimónias religiosas ou praticar a sua religião com outros crentes no Irão.

Mas os Baha'is não são o único grupo excluído do ensino superior no Irão. Aos activistas de direitos humanos, defensores dos direitos das mulheres, membros da oposição política e estudantes de jornalismo também tem sido deliberadamente negado o acesso à educação, de acordo com um recente relatório da organização não-governamental International Campaign for Human Rights in Iran.

Alireza Miryusefi, porta-voz da missão iraniana nas Nações Unidas, disse que apesar da Fé Bahá'í não ser reconhecida como uma religião oficial no Irão, os seus seguidores têm plenos direitos civis. "Contrariamente às alegações feitas pelos apoiantes do culto no estrangeiro, eles têm acesso igual às universidades e todos os anos, dezenas deles concluem a licenciatura em universidades iranianas", disse.

Miryusefi disse que as rusgas ao BIHE foram realizadas porque os envolvidos na instituição tinham "controlado sistematicamente as actividades de membros do culto, e… interferido nas suas vidas privada, social e económica”. Acrescentou que a organização tinha como objectivo enganar não-baha’ís com o objectivo final de criar "um movimento de culto extremista."

Ele disse que os detidos nas rusgas receberam um julgamento justo, e exerceram o seu direito de recurso.

Hoffman, fundador da campanha Education Under Fire, disse que o facto de o BIHE ter produzido "estudantes brilhantes" parece ser visto pelo governo iraniano como uma afronta.

Um ex-aluno do BIHE, Pedram Roushan, que recentemente completou um doutoramento em Física na Universidade de Princeton, é agora pesquisador pós-doutoramento na University of California, Santa Barbara.

Ele deixou o Irão em 2000, após completar um curso de cinco anos de engenharia civil no BIHE.

"Na época eu era adolescente, e percebi que sendo Bahá’í ia ser impedido de entrar em qualquer faculdade ou universidade do país", disse. "O preço de ser Bahá’í era muito alto nesses dias."

Dois anos depois de Roushan ter começado os seus estudos, Hassan matriculou-se no mesmo curso. A sua candidatura à universidade tinha sido rejeitada, apesar de ter notas elevadas no ensino secundário.

As candidaturas à universidade exigiam que ele declarasse qual era a sua religião, mas apenas apresentavam quatro opções, nenhuma destas era a Fé Bahá'í. Sem religião declarada, as suas candidaturas foram consideradas incompletas.

Depois de se licenciar, Hassan enfrentou novos desafios. Ele recebia um ordenado mais baixo, porque não tinha uma qualificação reconhecida, e foi afastado de vários projectos quando os clientes se opuseram à participação de um Bahá’í.

Quando a sua esposa, que tinha estudado Farmácia durante seis anos, enfrentou problemas semelhantes, decidiram ir para a Turquia, e foi-lhes concedido asilo nos EUA em 2006. "Não conseguíamos aguentar mais ", afirmou.

Antes de partir, Hassan cumpriu a obrigação esperada de licenciados do BIHE: reembolsar a instituição voluntariamente dando aulas de Física ao primeiro ano.

"Não concluímos apenas o BIHE e partimos; ficamos e ajudamos as gerações futuras", disse.

Ele considera surpreendente que pudesse ter sido preso, como tantos outros na sua comunidade, pelo "crime" de levar a educação aos jovens bahá'ís. "Os meus ex-colegas arriscam ser presos todos os dias - por causa da educação ", disse ele.

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FONTE: Iran bans 'underground university,' brands it 'extremist cult' (CNN)

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